sábado, 24 de setembro de 2011

 Comédia


A justiça divina implica em nos proporcionar a vingança mais doce possível.

Não é preciso mexer com os pauzinhos, somente lavar as mãos para um límpido aplauso.

Pode-se simplesmente rir da ironia vital, assim como pode-se sentir dó e perdoar.

Corações que foram amassados como papel se reformam em bronze.

Estamos em uma platéia e demoramos para saber que o esptáculo só existe porque também somos as estrelas.

Os descontrolados olham os ponteiros do tempo e não compreendem o porquê da pressa, mas continuam correndo.

Quem mais corre mais tropeça, e quem não corre, voa.

Os avoados se atrasam e precisam correr atrás dos ponteiros ligeiros.

Viria será, dos céus a açucarada comédia?

Não somos ninguém quando agimos por crédula capacidade vingativa.

Somos peças de um jogo enigmático. E quem joga é muito maior do que nosso ordinário rancor.

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Eu Narciso


Meu corpo inteiro está pulsando e estou leve como uma pena de rouxinol.
Êxtase e compulsões na roda gigante do meu parque narcisista e secreto.
Fora do meu eu. Próxima da bestialidade.
Sinto-me boiar n'àguas ilusórias.
Tenho unhas de chocolate amargo.
Num sobe e desce na velocidade crítica das cigarras vem aquela sensação de flutuar.
É tão relaxante estar diante de mim mesma.
Espelho rabiscado de batom sem reflexo.
Roubei de mim a virtude de saber sofrer.

Hoje o dia chegou assim, um tanto frio... frio de pouco intenso, não de temperatura. E eu me senti um tanto desanimada, da vida, da rotina, do cotidiano. Um dia assim me faz parar as coisas motoras que me movem. Não é bom nem é ruim, é insosso. Começou a garoar, eu precisei recolher, as roupas, os tapetes, a extroversão. A parte boa é estar em harmonia com a vida, é estar em sintonia com a espiritualidade, mesmo tendo cá meus questionamentos. Minha casa é escura, não tem janelas focando um gramado longo cheio de árvores no quintal, e isso é tudo o que eu desejaria num momento assim, ver as gotículas pousando nas folhas verdes enquanto descanço num sofá. Hum... agora lembrei, a Primavera chegou! Eu gosto muito desta estação, esperava anciosa por tê-la, mas ela veio e eu nem comemorei... quanta falta de consideração a minha.
Eu li uma crônica da Maitê Proença onde ela se questiona sobre a influência da beleza diante de um escritor, se existe uma inspiração maior em quem vê a natureza exuberante através de sua janela, por exemplo, ou se quem olha de seu vidro e enxerga o concreto, o  humano, o cinza, terá bons rascunhos para expressar sua visão da vida. Deve ser indiferente, não é mesmo? Pois enfim, tanto faz se você abre ou não sua vidraça, a beleza estará ali, dentro de você, e às vezes ela se esconde de você mesmo,sendo necessário pensar e sentir um pouco mais para revê-la. Hoje eu busquei a inspiração longe das janelas, estou embaixo de lâmpadas...
Mas esta tarde recém começou, não vou me basear em um dia infértil. Afinal as flores só se exibem por terem uma fase de inflorescência.